sexta-feira, 2 de julho de 2010

Mestre com estrelinhas

Para mim, quando a pessoa consegue um título como este nem precisaria escrever o resto. Coisa de jornalista. Sabemos que as pessoas leem mesmo são as manchetes. Tragédia na sala de aula é um nome maravilhoso. Pois bem, encontrei o futuro mestre na ladeira. Parecia tranquilo, assim como foi sua apresentação. Depois da minha “imprescindível assessoria” para excluir a barra do Windows, ele mesclou seus autores: Bauman, Paulo Freire, Augusto Boal, entre outros. Gente mais moderna, outros nem tanto, mas todos de peso. Trazendo afirmações contundentes como esta: "O teatro pode ser praticado mesmo por quem não é ator, da mesma maneira que o futebol pode ser praticado mesmo por quem não é atleta”.

Em determinado momento, segura de tal forma na mão uma máscara que estava sobre a mesa. Mais me parece uma cena de Hamlet. Na minha imaginação, vejo a caveira e ele a se perguntar: ser ou não ser? Creio que para quem ama o teatro uma máscara vale mais que qualquer imagem de São Jorge. Logo em seguida, o futuro mestre falou sobre suas peças na escola de São Leo, com títulos tão bons quanto a sua dissertação: Sem-teto, mas com esperança. Conta que os alunos diziam: “eu vi na internet, professor...” Ah, lá vem a minha pesquisa aí, gente! Por falar nisso, muita gente advertiu sobre o desânimo pós-pesquisa, mas ninguém disse nada sobre esta tara que eu sinto pela minha. Paixão total! Até parece mesmo um filho já que, às vezes, me pergunto: “fui eu mesmo que fiz?”

Mas, o assunto aqui é o Márcio que traz outra citação incrível, agora do Paulo Freire: “O mundo encurta, o tempo se dilui, o ontem vira agora. O amanhã já está feito. Tudo muito rápido. Debater o que se diz, o que se mostra e como se mostra”. Márcio não esconde o seu entusiasmo quando fala da educação para a arte e a potencialidade criadora do aluno.

A palavra vai para Danilo Streck. Ele ressalta, justamente, o engajamento do Márcio, sua vibração. Conta que, também conhece os bairros da periferia em São Leopoldo. Diz que o trabalho está bem acabado, que foi o fim das arestas que haviam na qualificação. Comenta que Márcio não cria expectativas que não vai cumprir. Ah, e diz uma coisa que me deixa levemente invejosa: o trabalho é coerente metodologicamente! Segue dizendo que meu colega trabalha bem com o contraponto esperança x indignação. Ou seja, a pesquisa do Márcio, é ele mesmo. Afinal, depois de conviver este tempo com ele sabemos que ele faz esta mistura com rara perfeição. Já mais para o final, pergunta o que o título de mestre acrescenta para o Márcio professor. Não resisto e imagino ele dizendo: “Bem, vou poder me inscrever em alguns concursos...”

Chega a vez da Mirna. Não é de hoje que ela vem me impressionando com sua capacidade de juntar palavras de uma maneira quase poética e desta vez não foi diferente. No início de sua fala, ela diz: “este pedaço de mim que habita a educação...” e a partir daí faz elogios, diz que Márcio fez escolhas acertadas e que o trabalho reflete sua visão de mundo. Comenta a mistura de Bauman com Paulo Freire, o que prova que este último era um visionário. Enfatiza a estrutura que entremeia a teoria com a prática que não fica confinada, mas sim, contaminada pelos autores. Bom, mas os comentários favoráveis terminam por aí. O resumo precisa ser revisto, deve haver legendas nas fotos, “lindas, inquietantes e provocadoras”. Fala bem esta doutora, não? Adverte que a palavra “projeto” não é mais adequada. Faz sentindo já que parece que se passaram alguns anos-luz desde então. Cobra do futuro mestre uma generalização feita sobre os professores. A partir daí, vai quase página por página.

Fala do estado da arte, enquanto o meu estado é de agonia. Talvez seja a minha falta de experiência com bancas, mas ainda não me acostumei com este processo. Entendo que nem todo mundo vá falar bem, que as pessoas comecem pelo que tem de agradável para dizer para depois, passar para as coisas que estão com problemas, mas estas “gralhas” como chamou Walter Lima Torres na minha defesa, por mim, podiam ficar para depois. Não é que as coisas que são ditas não sejam pertinentes. Ao contrário. Demonstra que houve uma leitura aprofundada e cuidadosa, mas, pelo menos para mim, acaba sendo desgastante. Talvez, por isso, tenha achado tão interessante quando um dos membros da banca de outro colega disse algo do tipo: “antes de qualquer coisa, quero dizer que, por mim, teu trabalho está aprovado, agora,vamos dialogar”. Espero lembrar disso quando chegar a minha vez de ser banca. Talvez, ouvindo meus pensamentos, Mirna pergunta, para o convidado: “Muito longo professor? Vou passar um pouco”. Logo dá sequência a questionamentos interessantes. Diz que gostaria de ver presente no texto algo que deu errado também e sai com mais uma das suas ao comentar: “Como diz a mãe de uma amiga minha...perfeição só no Festival das Malhas”. Sem demonstrar cansaço, Marcio diz que vai refletir sobre as colocações, que são janelas abertas para o seu trabalho. Eu confesso que nestas horas já teria me atirado por elas.

A palavra vai para a Silvia. Ela mesma festeja por ser a última. Elogia o texto contundente, o engajamento do Marcio. Diz que fica feliz quando pode compartilhar experiências. Começa falando de um jeito divertido, mas nem por isso, menos crítico. Observa que, às vezes, ficou achando que ele largou o autor e saiu correndo e depois voltava e perguntava: tá e aí? Comenta que ficou arrepiada com as fotos que fazem parte do trabalho e agradece ao Márcio por trazer a máscara. Considera que ele deveria se permitir “habitar umas zonas mais intensas”. Que autores será que ela e a Mirna andam lendo? Volta a fazer graça dizendo: “me deixa contigo como leitora. Não me joga e sai de perto”. Fala que sente falta de uma descrição maior do processo, de como foram sendo inventados os caminhos. Finaliza fazendo um comentário favorável sobre o fato dele ter uma experiência sistematizada em forma de pesquisa, mas que gostaria que ele mergulhasse um pouco mais no Boal. Eu disse finaliza? Não é bem assim. Fui eu que tive que sair da sala antes. Felizmente, sabendo que, em mais alguns minutos, teríamos outro mestre por aí e pelo trabalho do Márcio já dá para sentir que não estamos falando somente de alguém com um título para emoldurar e colocar na parede. Assim, quem encerra agora sou eu com uma frase justamente do Paulo Freire, mas que poderia ter sido dita pelo Mestre Silveira dos Santos: "Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino".

Helena Mello – Jornalista e mestra em Artes Cênicas

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